Muitos foram os funerais aos quais estivemos presentes nos últimos anos. Muito mais foram os corpos que vimos serem sepultados nesses funerais. “Saudade eterna…” “Morrer” não é exatamente “morrer”, mas transformar-se. Nós é que morríamos nos funerais.
Uma mãe que se cobre junto ao filho e faz da vala sua mais recente morada. O sentimento que perpetua e o coração que jamais será sarado. Os que morrem continuam vivendo sob a perspectiva de que se eternizam dentro de nossos corações e na memória daqueles que os amam. Os que remanescem morrem um tanto por dentro sob a perspectiva de que parte de si já não existe mais – por que fora ofertada ao solo.
A ilusão do sono e do sonho. A gente sabe, mas não deixa a ficha cair e nem crê no que a alma vê. Acreditar na existência de um sono profundo é a última coisa que queremos fazer, mas recorremos ao que não críamos implorando despertar de um sonho que não é real por que tudo é, afinal de contas, real e um fétido lamaçal.
A reconstrução. Nós acabamos de morrer e todas as páginas que escrevemos agora serão poucas diante daquelas que Átropos apagara concedendo-nos a missão de reescrevê-las com uma nova história a partir do ponto zero de um ciclo corrompido. É bem mais fácil escrever nos pergaminhos da alma que preencher os espaços deixados por alguém que a gente ama: assemelhar-se ao seu corpo na vala – pálido, tumefato, dissecado ou esquelético, um silêncio que grita ou um grito que silencia. É estar dentro do corpo e demorar para senti-lo exalando as leis do She’ohl’ nos parâmetros pretensiosos da mortalidade. Querer morrer já estando morto.
Nós – os mortos. As gárgulas não gritam do lado de lá e as quimeras não cantam do lado de cá. É preciso sorrir em memória dos que vivem, pois alcançaram a imortalidade e o infinito que nós mesmos desenhamos enquanto morremos. A verdade é que nada definitivamente acaba, pois até mesmo a memória é a força motora de nossos atos. “Eu que morro, como deveria estar de acordo com a vontade de quem veio a viver?” A resposta está em nossos corações.
P.S.: Sob inspiração dos beijos que a morte me deu.
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