Reprodução: Minidicionário Aurélio (FERREIRA, 2010). |
Já se defrontou com o significado de uma palavra que você julgava
ser totalmente diferente? Por exemplo, chamar alguém de “coitado”
significa que esta pessoa sofreu um coito, ou seja, a cópula.
Chamá-lo de “tadinho”, no diminutivo, apenas denigre ainda mais
a imagem do “coitado”, tornando-o ainda mais vítima de um
estupro linguístico (antes seja!). A menos que ele tenha de fato
sido estuprado, não faz o mínimo sentido associar coitado a
condição de sofrimento. Mas como o ser humano não se conforma com
uma língua estática, ele a dinamiza atribuindo novos significados
às palavras existentes ou criando outros vocabulários.
Sabe “porra”? Não chega a ser um palavrão, pelo menos para mim
que o compreendo como uma interjeição: “Eita, porra!” Assim
como “Puta que pariu!” Aprendi essa com a saudosa Irandé
Antunes, que a galera de Letras deve conhecer muito bem. Mas
finalmente, quais os significados originais de “porra” e “puta”?
“Porra” é comumente utilizado como sinônimo de “esperma” e
“puta”, de prostituta. Mas “porra” é um pedaço de pau. E
“puta”, assim como “rapariga”, significa “moça”, “mulher
jovem”. Agora imagina a frase para os dias de hoje: “Coitada da
rapariga, meteram a porra bem no meio da face dela!” Uma mistura de
denotação com conotação que me deixa oco! Só não sei porquê
“puto” significa um homem gay. Mas acredito que “veado” tenha
a ver com a feminilidade de alguns, ainda que “gay” também
signifique “feliz”.
Caralho! “Caralho” é uma cestinha que ficano alto do mastro das
embarcações. Alto, neh? Por causa de suas mentes poluídas, os
homens começaram a associar a altura do caralho com o tamanho do
pênis. Cada um que quisesse ser maior do que o outro, se bem que na
Idade Média pau grande era rejeitado como pau pequeno é hoje em
dia. Inclusive, “pau” tem a ver com “porra”, “porrete”,
“cacete”, mencionado anteriormente. E se fosse um gravetinho? …
Ah, como castigo, alguns marujos também eram mandados para o
caralho, ficar lá no alto do mastro, sentados por horas depois de
fazer algo errado que prejudicasse a tripulação ou qualquer coisa
que merecesse sentar no caralho.
Chegou a hora dela! Estamos falando da “boceta”! “Alô, alô,
graças a Deus!” (BRASIL, 2015) Agora, outra poesia, ou melhor, o
fragmento de mais uma:
[…] Que a narração mundana lhe fazia,
Da profunda algibeira a caixa arranca
Do tabaco, abre-a, tosse, esfrega os dedos,
E uma grossa pitada apanha e funga.
O perspicaz conselho o imita logo;
Aventam-se as bocetas; os obséquios
Trocam-se mutuamente os convidados;
Qual de uma vez na larga venta insere
O precioso pó; qual o divide
Benévolo entre as duas; e co’os lenços
Os reverendos… sacudidas, […]
– O Almada: Canto IV, Machado de Assis.
Todo mundo pensa que “boceta”, e às vezes “tabaco”, é o
órgão genital feminino, mas, segundo o Aurélio, “boceta” é
uma “caixinha redonda, oval ou oblonga” (FERREIRA, 2010, p. 109).
Machado de Assis deixa claro na poesia, as definições: Tabaco, pó
para cheirar (ou rapé); boceta, a caixa onde se guarda aquele pó no
belo poema. Ou você acha que Assis falaria que abria, tossia nela,
esfregava os dedos, fungava (cheirava) as *** adentrando-as com as
“ventas largas” (narizes grandes) colocando pozinho e tudo mais?
Seria um Cinquenta Tons de Cinza em pleno Realismo brasileiro.
“O que é? O que é? Lambi, lambi, no teu cu meti!” Calma, gente!
“Cu”, que vem do latim “culu”, é o buraco da agulha de
costura e, por causa de sua localização no objeto, a palavra virou
sinônimo de “ânus”. Já a parte de meter ou não meter, fica à
parte de ser uma questão linguística para ser pessoal. ‘Meter ou
não meter? Eis a questão!’
Estas duas variações de significados, simbólico/representativo e
literal, chamam-se “conotação” e “denotação”. Quando nos
referimos ao significado real da coisa, estamos usando o significado
denotativo. No caso de linguagem simbólica, ilustrativa etc.,
estamos nos utilizando do significado conotativo. Há também o que
chamamos de “variação linguística histórica”, que são as
mudanças que a língua sofre com o passar do tempo, visto que toda
língua que é viva está em constante transformação.
Agora, um textinho de despedida em linguagem DENOTATIVA que não dá
muito certo nos dias de hoje:
Enquanto o jovem coitado fora assunto em toda a cidade, o alfaiate da
rua direita, nem aí, lambeu tanto e tanto, que quase não esperei
que enfiasse seu principal instrumento no cu. Marujo dedicado que
sou, não poderia retornar a minha viagem com uma veste repetida,
ainda que me mandem sentar no caralho como castigo pelas minhas
desandadas em alto-mar. Certa vez, lançaram a porra sobre mim quando
ousei mexer na boceta do capitão enquanto dormia. Vida de mar não é
fácil. E que pena do menino! Quem será que o coitou?
Conseguiria fazer a versão atualizada do texto acima? Coloca aí nos
comentários que publicaremos mais tarde! Até mais!
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