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O menino que publicou Monteiro Lobato

"Retrato do Saci" (2007), por J. Marconi.
Quem de nós nunca foi apaixonado pelas lendas folclóricas quando crianças? Ficávamos quase que hipnotizados na escola ouvindo as mais diversas e curiosas lendas dos nossos coleguinhas naquela famosa Semana (ou mesmo o mês) do Folclore, que nos inquietam até hoje. Ouvimos histórias sobre a Maria Florzinha, a Mula Sem Cabeça, o Negrinho do Pastoreio, o Lobisomem, a Caipora, o Boitatá, o Curupira, o Boto Cor de Rosa, entre outros, e o mais famoso de todos eles: o Saci Pererê.

O Saci Pererê é um personagem travesso com um gorro vermelho e cachimbo, gosta de espantar cavalos e causar transtornos domésticos, como queimar comida e acordar pessoas com gargalhadas - imagine a cena. Contudo, evita entrar na água. Em algumas regiões, assim como Maria Florzinha e a Caipora, o Saci Pererê também assusta viajantes noturnos ou caçadores com seu assobio, faz trança nos cabelos de animais e os cansa com correrias. Corre num redemoinho de vento quase imperceptível. De fato, os três personagens chegam a se confundir bastante na cultura popular.

Edição Fac-similar da Fund. Odebrecht, 1998.

O primeiro escritor brasileiro a dar atenção ao personagem Saci Pererê foi Monteiro Lobato (1882-1948), que após realizar uma pesquisa com os leitores do jornal O Estado de São Paulo, publicou em 1918 o seu primeiro livro intitulado “O Sacy-Pererê: Resultado de um inquérito” (Escrita original, conforme a ortografia da época). Segundo o site Crearte.com.br, o escritor pediu aos leitores do suplemento Estadinho que escrevessem para a redação contando suas experiências e cedendo informações sobre o Saci Pererê. Lobato pedia que abordassem pelo menos:
  1. A concepção pessoal do Saci; como o recebeu na sua infância; de quem recebeu; que papel representou tal crendice na sua vida, etc...
  2. Qual a forma atual da crendice na zona em que reside.
  3. Que histórias e casos interessantes, "passados ou ouvidos" sabe a respeito do Saci.
As cartas recebidas e publicadas por Lobato não só revelam as várias "manifestações" (versões) do Saci ao povo, como também revelam um pouco da sociedade brasileira naquela época. Observe que o Saci representado na capa da obra, com chifres e dentes afiados, passa longe de ser o sujeito brincalhão descrito hoje na Literatura Folclórica.

Detalhe de Ossanyin, por Carybé.

O pequeno rapaz negro de apenas uma perna talvez seja uma variação da entidade afro-brasileira, o orixá Ossanha (ou Osanyin, Ossaniyn, Ossain, Ossanhe. Sincretismo: São Benedito), que também possui apenas uma perna e vive nas florestas. Isto não é defendido pelos pais de santo e demais adeptos das religiões afro-brasileiras, mas o mito africano, pode, no mínimo, ter dado origem à narrativa brasileira do Saci.

A obra de Lobato teve sua primeira edição em 1918, a segunda 90 anos mais tarde - 1998 - e a terceira em 2008, pela Globo, com atualização ortográfica. O Saci foi quem primeiro publicou Monteiro Lobato - convenhamos a popularidade.








Colaboradores: Danilo Rodrigues e Williams França.
Imagens: Exceto a fotografia da edição fac-similar, as demais imagens desta postagem foram baixadas da Wikipédia - a enciclopédia livre. O exemplar fac-similar encontra-se disponível para consulta local na Biblioteca Pública Municipal Antonino Macêdo, em Itamaracá - PE.
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CREART. Inquérito sobre o Saci. InHistórias de Saci. Disponível em: http://www.crearte.com.br/saci.htm. Acesso em: 14 jun. 2015.

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